Pesquisa CAUSE: MEDO DA POLÍTICA

Os entrevistados mencionaram ainda temores ligados à reputação pessoal, principalmente em decorrência da má percepção que a atividade política adquiriu e da falta de privacidade à qual os políticos são expostos.

Minha geração está com medo da política. E não estou falando somente de nós, os “trintões” brasileiros, mas também de outros tantos homens e mulheres de várias partes do mundo, como você e eu. Pelo menos é o que indica uma pesquisa realizada ao longo do mês de junho com mais de 70 lideranças sociais, empresariais e acadêmicas do mundo todo. Mais do que a faixa etária em comum, na sua maioria entre 35 e 40 anos, e a experiência concreta em suas áreas de atuação, os pesquisados fazem parte dos Jovens Líderes Globais, grupo instituído pelo Fórum Econômico Mundial há mais de dez anos.

O primeiro temor em número de menções é aquele que diz respeito aos impactos na vida pessoal, notadamente em questões ligadas ao balanço entre família e política e à segurança física. Trazendo esse resultado para a realidade brasileira atual, a preocupação faz todo o sentido. A violência extrema em algumas regiões do país e a ascensão do crime organizado, que passa a participar da vida política para tentar influenciar decisões governamentais, parecem ter provocado o assassinato de diversos candidatos e políticos na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro. Há cerca de 45 dias, também presenciamos um ataque em Itumbiara/GO, cuja motivação ainda não foi completamente identificada. O cenário é muito preocupante, seja pelo medo causado em possíveis jovens lideranças ou pelos efeitos nefastos que isso traz ao sistema político como um todo. Mas mortes relacionadas à atividade política estão longe de ser exclusividade brasileira. Internacionalmente, tivemos um caso igualmente trágico e que gerou repercussão mundial: o assassinato de Jo Cox, deputada trabalhista inglesa que defendia a permanência do Reino Unido na Comunidade Europeia e que fazia parte ativamente do grupo de Jovens Líderes Globais, o que provavelmente impactou nas respostas dos participantes da pesquisa.

Os entrevistados mencionaram ainda temores ligados à reputação pessoal, principalmente em decorrência da má percepção que a atividade política adquiriu e da falta de privacidade à qual os políticos são expostos. Neste mundo novo em que vivemos, a transparência virou dado de realidade – e não mais condição eventual. Por outro lado, a mesma revolução que exige mais transparência da classe política também pode massacrar a reputação de alguém em minutos, a partir de boatos disseminados pelas redes sociais, como os que vicejam em qualquer período eleitoral. Por fim, o último medo se refere a entrar de vez na atividade política, mas não conseguir fazer nada, não conseguir gerar nenhum impacto positivo, em razão do ambiente corrupto e pouco meritocrático percebido pelos entrevistados.

A sensação parece indicar que a luta está perdida. E esse sentimento aflora justamente no grupo etário que, pela lógica da vida na pólis, deveria estar assumindo posições de liderança no lugar das gerações que começam a se aposentar, voluntária ou forçosamente. Não quer dizer que não tenhamos noção da importância e dos impactos da política em nossas vidas e na de nossas comunidades. A mesma pesquisa que indica os temores, igualmente mostra que o desejo de transformar o mundo pela via pacífica, ou seja, pela ação política, ainda é indiscutivelmente majoritário entre os pesquisados. Há, portanto, dois caminhos possíveis: ficar paralisado, com medo, ou arregaçar as mangas e agir para mudar, agora.

Considerando todas as evidências de que o nosso sistema político está em colapso, não há outra alternativa senão agir. Precisamos construir e implementar uma visão de futuro para o Brasil, plural e baseada nos valores deste século, retomando a ideia da política como busca do bem comum. Mas, para isso, precisaremos vencer os temores, com determinação e firmeza de propósito, pois há muito o que fazer. O caminho será árduo e inóspito, mas tenho convicção de que, juntos e com objetivos claros, podemos transformar radicalmente nossa sociedade.

Leandro Machado, 38, cientista político pela Universidade de Brasília, é sócio da consultoria CAUSE.


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