Enxergando o Futuro: Após perder a visão, Daniela Reis criou projeto de alfabetização em braile

Tudo começou quando, aos 23 anos, ela descobriu uma retinose pigmentar -- doença ocular degenerativa, que causa dificuldade em enxergar ou perda total da visão.

Projeto Enxergando Futuro

Texto: Esmeralda Angelica

Fotos: Nayara Zattoni

A farmacêutica magistral Daniela Reis Frontera, de Duartina (SP), usou de sua própria história para criar o projeto Enxergando o Futuro, que alfabetiza pessoas com deficiência visual no método braile. Tudo começou quando, aos 23 anos, ela descobriu uma retinose pigmentar — doença ocular degenerativa, que causa dificuldade em enxergar ou perda total da visão.

“Desde criança eu sempre tive alta miopia e astigmatismo. Mas, depois que eu me formei, comecei a ter dificuldade de dirigir à noite e tinha falhas no campo visual. Já bati meu carro duas vezes pela cegueira noturna”, conta.

A doença avançou, e Daniela passou a não enxergar 100%. Com esse novo desafio, em novembro de 2019, ela buscava se alfabetizar em braile, mas o processo de encontrar um profissional se tornou um problema, afinal, ela não encontrava alguém que fizesse, mesmo que pagasse pelo trabalho. Quando, enfim, encontrou um professor, Daniela desejou ensinar de forma gratuita outras pessoas com deficiência visual.

Mais de 200 pessoas alfabetizadas

O projeto Enxergando o Futuro, que nasceu em 2019 dessa experiência pessoal, já alfabetizou cerca de 200 pessoas em 25 estados brasileiros, e Daniela tem objetivos ainda maiores para a iniciativa: “Estamos transformando o projeto em uma fundação, onde vamos implantar a inclusão no esporte, no mercado de trabalho, vamos oferecer auxílio jurídico, terapêutico e tecnologia assistiva. Estamos remodelando a estrutura da nossa plataforma para futuramente ela ser multi idiomas, alcançando outros países com a língua inglesa, francesa e espanhola, embora o braile seja uma linguagem universal”, conta.

Uma das preocupações que segue motivando a empresária a expandir cada vez mais seu trabalho é justamente a falta desse tipo de suporte para pessoas com deficiência. “Isso me preocupa até hoje, porque as crianças que nascem cegas, por exemplo, não conseguem se alfabetizar no braile por falta de profissionais capacitados, e são alfabetizadas somente na voz. Com isso, elas não aprendem a escrever direito, o formato das letras, etc”.

Cursos oferecidos

O carro chefe do projeto é a alfabetização em braile. Contudo, Daniela explica que, através de parceiros, consegue oferecer outras atividades aos seus alunos, como dicas de acessibilidade em tecnologia, rodas de conversa com uma psicóloga uma vez por mês, lives e conversas com oftalmologistas, além de aulas de danças e pilates na escola “Balé às Cegas”, e também aulas de música, com o projeto PROMUVI, onde os alunos aprendem a cantar e tocar instrumentos. “Estamos tentando estimular esses alunos e mostrar que a vida não acabou, e que o braile é a ferramenta principal para que você tenha uma alfabetização perfeita e seja incluído no mercado de trabalho, em empresas com responsabilidade social”, explica.

Desafios superados

Com a chegada da pandemia e a necessidade do isolamento social, Daniela precisou reinventar seu projeto, assim como a maioria dos brasileiros. O principal desafio, além das barreiras impostas pela crise sanitária, era ensinar o método braile à distância para os seus alunos. “Eu pensei: caramba, como eu, que não enxergo, vou ensinar braile para uma pessoa que também não enxerga, e de longe?”, recorda.

Mas logo surgiu uma solução: Daniela e sua equipe montaram uma metodologia que ela considera pioneira no ensino de braile, e consiste em acompanhar individualmente cada aluno, além da plataforma de ensino oferecida por ela. “Temos um grupo no WhatsApp onde orientamos cada um dos alunos. Fazemos ligação de vídeo para quem está tendo dificuldade, pra mostrar as lições, pro aluno tatear na casa dele”, explica. “O desafio foi esse, transformar o que eu aprendi de forma presencial à distância e com acessibilidade”.

Como o ensino é realizado

Quando o aluno faz a inscrição na plataforma, ele é ensinado a confeccionar todo os materiais das aulas, que são recicláveis, feitos de tampinhas de garrafa pet e bolinhas de gude.

Assim, quando o material está pronto, começa o processo de alfabetização. Os módulos são liberados na plataforma de ensino, e o leitor do celular ou computador começa a narrar tudo o que o aluno precisa fazer, tudo isso à distância. “Ele vai colocando os pontos corretos, tira uma foto e manda no grupo do WhatsApp com um áudio descrição da foto. Depois, passamos corrigindo. O ensino continua sendo o tato, mas o aluno lá, e a gente aqui”, explica a empresária.

Histórias transformadas e como ajudar

Daniela lembra de uma história de um senhor de cerca de 40 anos que nasceu cego, que se mostrou emocionado quando percebeu que conseguia entender as letras, ler frases e entender o próprio nome. O depoimento consta no Youtube. “Isso não tem preço. Essa recompensa que a gente tem é a força que dá pra continuar fazendo esse trabalho”.

Apesar de contar com alguns parceiros como a Magazine Luiza e a One Nature, o projeto ainda precisa de apoio financeiro. Agora, o Enxergando o Futuro busca por uma empresa que abrace a causa de pessoas com deficiência visual, afinal, a intenção é transformar o braile em uma língua nacional ao lado da língua de sinais. “Queremos que alguma empresa olhe e apadrinhe o nosso projeto, porque queremos levantar um voo grande e ‘brailetizar’ essa galera que precisa”, finaliza.

Para doar, basta entrar em contato pelo número (14) 997408317 ou pelo site www.enxergandoofuturo.com.br e também via email adm@enxergandoofuturo.com.br. Para quem deseja ser voluntário do projeto, os contatos são os mesmos.


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