É possível evitar um futuro cinza? Mariana Napolitano, gerente do WWF-Brasil, aponta para ações de preservação das matas
O envolvimento com projetos tão relevantes faz Mariana se enxergar como uma agente transformadora no que diz respeito à preservação do meio ambiente, mas ela reconhece que sozinha não conseguiria ir tão longe.
Mariana Napolitano Ferreira, de 41 anos, é líder da área de ciências e do time de Áreas Protegidas do WWF-Brasil (Word Wide, Fund for Nature; fundo mundial para a natureza, em tradução livre) — uma organização não governamental que atua nas áreas de conservação, investigação e recuperação ambiental.
Sua jornada com as pautas de conservação começou cedo: aos 7 anos, ela acompanhava as publicações nos jornais e revistas sobre meio ambiente. “Eu tinha uma pasta cheia de recortes sobre esses projetos. Mandava cartas, e o que eu acho mais legal é que as pessoas me respondiam. Tenho até hoje respostas do projeto Ararinha Azul e Lobo Guará”, recorda.
Trabalhos, projetos e frentes de atuação
Há 12 anos no WWF-Brasil, Mariana explica que existem duas principais frentes de trabalho na área de ciências, seu campo de atividade: a primeira acontece ao lado de parceiros da academia e organizações que produzem análises e dados específicos, que norteiam os projetos de conservação da organização. “Fazemos uma análise, desde 2004, que é uma gestão das áreas protegidas para entender o status de gestão desses territórios. Conseguimos, ao longo dos anos, com a alocação de recursos, perceber o que evoluiu, quais são as lacunas, o que precisa de mais atenção”, conta. A outra parte deste trabalho consiste em traduzir as informações científicas para toda a população: “Nós traduzimos mesmo esses dados, pois acreditamos muito no papel da sociedade como um ator super ativo para determinar políticas públicas, investimentos, prioridades, alocação de recursos”.
O envolvimento com projetos tão relevantes faz Mariana se enxergar como uma agente transformadora no que diz respeito à preservação do meio ambiente, mas ela reconhece que sozinha não conseguiria ir tão longe. “Meu trabalho é uma peça pequena dentro da organização, que também é uma peça dentro de uma diversidade enorme de organizações que fazem trabalhos importantíssimos. Além da sociedade civil, tem todo o setor privado, que tem um papel fundamental nessa agenda; e a academia, no tocante às pesquisas. Buscamos priorizar, de fato, nosso tempo e recurso, com esse olhar de onde e como gerar mais impacto nesta força de mudança e melhoria de mundo”.
Brasil é um dos países que mais concentra desmatamento
O relatório “Frentes de desmatamento: vetores e respostas em um mundo em evolução” divulgado em janeiro deste ano pelo WWF-Brasil, indica que o Brasil está entre os campeões de desmatamento de florestas e outros biomas. Com esse alto índice, o país perde biodiversidade, afeta o clima do mundo e ainda pode ser o centro de surgimento de novas zoonoses. “Infelizmente, as fronteiras de desmatamentos estão concentradas em regiões de grande biodiversidade, América Latina, África e Ásia. O Brasil é o único dos países que têm duas fronteiras na lista, que é a Amazônia e o Cerrado”, explica a bióloga.
Contudo, entre os anos de 2004 e 2012, a realidade era bem diferente: com uma redução de mais de 80% na taxa de desmatamento, segundo relatório da ONU. “Naquela época, o país estava tendo um crescimento econômico significativo, mostrando que podemos ter uma realidade socialmente justa com a conservação da natureza, e ,agora infelizmente, estamos contando uma história diferente”, lamenta.
“Existe a necessidade de um trabalho muito forte de combate ao desmatamento, de achar quem são os responsáveis e realmente fazer com que as multas e infrações ambientais sejam aplicadas, e, além é claro, de um trabalho a longo prazo para promover e fomentar uma economia com base na floresta em pé”, como ocorre com o projeto PIS (Projeto Paisagens de Inovações Sustentáveis), no Acre. É uma questão de implementar políticas e mecanismos financeiros para manutenção dessas áreas”, explica.
PADDD – o que é, e os projetos de monitoramento do WWF-Brasil
Desde 1971, o Brasil sofre um processo intenso de degradação natural, pesquisadores denominam o fenômeno pela sigla PADDD (Protected Areas downgrading, downsizing and degazettement), ou seja, recategorização, redução e extinção de áreas protegidas. O PADDD ocorre em todos os continentes, sendo um fator de risco para as áreas designadas para a conservação da biodiversidade e os modos de vida de povos indígenas e populações tradicionais.
Para detectar e dimensionar o tamanho dos impactos desses processos, a WWF-Brasil, com apoio da Conservação Internacional, criou uma plataforma online, chamada da “PADDDTracker-Brasil”, e Mariana lidera a operação no Brasil. “Percebemos que os casos são argumentados como exceção, mas estamos falando de mais 150 eventos de PADDD acontecendo no Brasil, eles vêm se repetindo e aumentando”, relata.
O Brasil já perdeu 10 milhões de hectares de áreas protegidas, um valor significativo e, em grande parte, territórios da Amazônia; 80% dessas áreas foram eliminadas depois de 2008. Para reagir e conter esses ataques massivos aos recursos naturais, o WWF-Brasil treinou mais de 20 organizações do Cerrado, para que elas possam atuar efetivamente nos processos PADDD com incidência política, comunicação, campanhas e petições.
É possível prever um futuro verde?
Os números são alarmantes, e as ações combativas precisam entrar em curso para evitar um futuro cinza. A manutenção do planeta para as gerações atuais e as próximas, segundo a bióloga, depende, primeiramente, da conservação dos biomas e espécies; e, segundo, é fundamental tornar os sistemas produtivos mais sustentáveis. “Precisamos usar a água de forma mais racional, produzir energia de uma forma que gere menos impacto, mudar a trajetória dessas curvas, mas trabalhar também nessas áreas onde a vida, a economia, e a produção estão acontecendo”.
Mariana ressalta ainda a importância de alertar a sociedade civil sobre essas perdas, para vislumbrar um amanhã mais verde: “Precisamos mostrar os benefícios da natureza para a saúde, bem estar, o valor econômico das áreas protegidas. Existe uma agenda positiva acontecendo, por exemplo, a população de onça pintada crescendo no Parque Nacional do Iguaçu, com a sua preservação; e, mesmo assim, essa área sendo visitada, gerando recursos econômicos para os municípios.”
A bióloga acredita na eficiência da atuação coletiva entre sociedade e tomadores de decisão. “É valioso quando temos condição de discutir prós e contras de qualquer coisa com a sociedade civil, com o setor privado e com o governo na mesma mesa, assim conseguimos de fato avançar”, finaliza.